18.2.10

quando me rendi a antonioni.

Concordamos todos que há algo sempre de muito poético nos destroços. Já que andamos numa da beleza na e pela destruição, aqui está a prova de que frangos e repolho e lagostas a voar no meio de pó e bocados de tudo e nada podem também tornar um momento sublime.


zabriskie point, antonioni, 1970
(aconselha-se volume máximo)

7.2.10

quando me rendi a Sarah Kane.

Ainda no seguimento deste - e deste meu anterior em que se pös no mesmo plano a literatura frente a produçao de imagens, será que a crueza e crueldade nas palavras de Sarah Kane de certa forma não será mais forte enquanto não materializada?; de certa forma, a liberdade interpretativa que nos é possível ao imergir no imaginário brutal que constrói e o modo como ela nos atira para o seu mundo pantanoso, apesar de tudo muito gráfico, não será filtrado e sempre muito levemente tratado quando nos forcamos a tornar físico aquilo que é produzido muito "metaforicamente"?; - Metaforicamente, porque nao sei bem se o "objectivo" de Sarah Kane é ser violenta, ou se esta violencia é "só" apenas usada como expressäo, porque é algo que domina e que experimenta interiormente muito no limite, para tentar encontrar a sua "verdade", um nietzschiano "móvel exército de metáforas"? .

quando me rendi ao expressionismo alemão.

"Before a cornfield he said:
The fabled fidelity of cornflowers
is a fine motif for women painters,
but i prefer the profound opera of the poppy.
It makes you think of blood clots and menstruation.
Of sufferinf, spitting up, going hungry, kicking the bucket -
in short: of the murky path of man."

Before a Cornfield, Gottfried Benn, 1913.


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No seguimento deste post, só queria dizer que não me parece que o papel do "C"inema seja o de entreter. Irrita-me de certo modo a atitude "programa com o namorado/a fim de semana" que raramente varia entre o museu, o centro comercial, e o cinema (que não raras vezes é dentro do centro comercial) - alternada e aleatoriamente. Não me parece que todo justo que o cinema tenha de se inscrever neste circuito plasticamente cultural, em que para ocupar o tempo, se espera algo mastigavel e previsível. Talvez assim não seja possível compreender que, noutra dimensão, - talvez com mais algumas dimensões que a literatura (não tenho bem a certeza) - tem a ver com toda a construção de um universo - mais ou menos ficcionado - que tem de ser verdadeiro (no sentido do genuino), e portanto comprometido com uma sinceridade inquestionável que torna justificados todos os meios/grafismos/e artifícios. Aliás, se em algum momento se trata de lidar com emoções extremas, seria muito errado e injusto se não nos colocasse numa posição de desconforto, se não partilhasse aquele envolvimento a todo o custo que é irremediável nos livros que nos prendem da primeira página à última palavra. Tenho admitir que não vi o Anticristo, senão alguns fragmentos, embora tenha ouvido todo o tipo de críticas de público-gosto-muito-de-cinema-e-tambem-pipocas. Ouvi comparações com o Irreversível, alegando um voyerismo pretensioso, ouvi também que o pretexto não é mais do que a procura de um mediatismo "à là Von Trier" extremo, enquanto quando me lembro, por exemplo, do que é transversal a Breaking the Waves, Dogville, Dancer in the Dark, não vejo senão um prazer puro e e sofrido por uma procura da beleza na nudez da crueldade mais visceral do "ser humano". Para responder à cena do "ralenti", talvez em 1925, esta cena (em baixo) do "Battleship Potemki" (na qual é impossível negar a sua beleza) tenha ainda sido mais chocante - na altura cortado em pedacinhos nos EUA alegadamente por conter cenas de extrema violência, e posteriormente, motivo de "homenagem", quase elemento recorrente em muitos outros filmes como o " 'Padrinho". Ao mesmo tempo, e mesmo assim supostamente demasiado agressivo para a susceptibilidade comum da época, todo o filme marcou uma estética nova no cinema, e torna-se referência no panorama expressionista alemão, tanto no cinema em si, como em outras expressões (temos o Bacon como exemplo disso). O que deixa perceber que "censuras gráficas" não são mais do que produto de convenções mesquinhas sempre muito circunstanciais num tempo que rapidamente se vê esgotado. Para mim, não há nada mais violento que um exemplar filme de domingo à tarde.


Battleship Potemki, 1925, Sergei Eisenstein